domingo, 5 de junho de 2016

Em Amarante Abafa-se

Praça Medonha - S. Pedro - Amarante
Fotografia de Anabela Matias de Magalhães

Em Amarante Abafa-se

Em Amarante abafa-se cada dia mais. E não é pelo excesso de sol nem pelo excesso de calor mesmo que sem sol. Em Amarante abafa-se cada dia mais pela falta de respeito pelo espaço e pelo ar que é nosso e quando digo nosso quero dizer de todos os habitantes e de todos os transeuntes que por aqui habitam e circulam independentemente de sexo, cor, idade, condição económica, origem geográfica, orientação sexual, instrução... e... muito importante, religião... que até pode não existir de todo.
Ora, ultimamente, tenho constatado um avanço sistemático e constante por parte da igreja católica local sobre muito do que é público e deve ser e permanecer laico para que a Constituição da República Portuguesa possa ser cumprida.
É o caso do espaço público a que agora chamo Largo Medonho, com cruz latina inscrita nos calhaus que por aqui abundam e, dentro dela, as afamadas chaves de S. Pedro ou chaves do céu também talhadas nos calhaus que por aqui abundam e tornam a abundar em tons claros, escuros... e em durezas mais ou menos consistentes, frequentemente em durezas duras comó calhau!

Hoje foi dia de descer a rua que é minha desde que nasci e escutar, espantada, alto e bom som, a missa que acontecia dentro da Igreja de S. Gonçalo.
Quem se presta a estes papéis, quem decide e quem autoriza a difusão de uma missa católica transmitida em directo pelo ar que é público para um espaço que é público e que é meu, teu, nosso, vosso, gente de todas as idades, de todas as condições, de todas as opções sexuais, que adoptou todos os credos e mais alguns, que segue todas as seitas e religiões ou que optou por zero disso apenas porque lhe apeteceu, tem o direito de exigir a reposição da legalidade.

Que parte é que não perceberam do princípio geral de independência entre Estado e Religião?
Que parte é que não perceberam dos direitos e garantias que também são meus e que devem ser salvaguardados?
Hoje, gramei uma missa enquanto degustava o meu café matinal. Ora, se eu estivesse interessada nela dava meia dúzia de passos e entrava na igreja. Certo? Tal como o fizeram muitos crentes, presumo que todos os crentes, que estiveram interessados nela.
Hoje, dentro da Igreja de S. Gonçalo, a liberdade de praticar a religião católica esteve salvaguardada para os católicos. Mas a minha liberdade de não católica foi alegremente violada. Aqui deixo o registo da coisa para memória futura.

Nota - Este foi o primeiro episódio deste teor a que assisti. Não garanto que tenha sido a primeira vez que a igreja católica local deitou as garrinhas de fora com o consentimento de quem está já de cócoras perante ela.
Eu só posso lamentar, envergonhada, o que se está a passar nesta terra que já foi de gente arrojada e revolucionária.

4 comentários:

Carla Oliveira disse...

Concordo plenamente. Não sou católica e por varias vezes fui obrigada a participar, festas de junho, pascoa, reza do terço. Quem estiver interessado e se sentir feliz com essas praticas que o faça mas não me arrastem junto porque, eu, não quero.

Anabela Magalhães disse...

Obrigada por aqui deixar esse registo, Carla Oliveira! Parece que as pessoas têm medo de expressar as suas opiniões. Ora, a Inquisição já não está activa e a polícia dos costumes da Arábia Saudita e afins não chega aqui... pois não? Além do mais, temos uma Constituição que temos de cumprir e respeitar. Por aqui há quem esteja a precisar de a ler... ou reler, não sei...
Beijinho e votos de excelente semana!

Anónimo disse...

Falta verde

Anónimo disse...

" Abafa-se" mesmo!!!...e de que maneira!!!!

 
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