domingo, 14 de setembro de 2008


Sonhadores - Essaouira - Marrocos

Sonhadores de um Freud agastado ou o Triângulo dos três P

Com os meus agradecimentos à minha amiga Rosinha, companheira de profissão e de estrada, de angústias e alegrias, de fracassos e vitórias, de dúvidas e certezas, que me enviou este belíssimo texto sobre a nobre arte de Ser Professor.

“Para se ser professor em Portugal, das três uma: ou se é “puro”, ou se é “poeta”, ou se é “pendura”.
Dos últimos não rezará a História. Vendedores de aulas em saldo, mercantilistas da ignorância, não arriscam o sono, nem o investimento pessoal. Seguem os manuais que nunca leram e saltam as matérias que não entendem. Agentes reprodutores das faltas de castigo, atingem performances imbatíveis na média diária de alunos que expulsam das aulas.
Directivos e intolerantes, defensores acérrimos das parcas teorias académicas recentemente adquiridas, desprezam com arrogância"o saber de experiências feito".
Militantes da autoridade e do autoritarismo, escondem fisgas na algibeira, sempre prontos a atirar pedras, derrubando tordos que se atreveram a cantar como rouxinóis.
Destes não rezará a História. Não são “puros” nem “poetas” e muito menos professores.
Dos “puros”, talvez já reze a História…
Cordas vocais desgastadas pelo tempo, cumpridores e dedicados, carregam aos ombros a responsabilidade eterna de ensinar. Meticulosos com o programa, solidários com a obrigação, sabem a matéria de cor e recusam-se a acrescentar uma vírgula. Reconfortada a consciência nos parâmetros do dever, não reivindicam, não reclamam, não se insinuam. São professores, sempre o foram, sempre ensinaram, antes com sucesso, agora com insucesso.
Nem mesmo assim se questionam. Para quê? A reforma já não tarda e a casa fica tão perto…
Estes, pelo menos, mereciam uma estátua, ou um monumento “ao Professor Desconhecido”. Valem tanto como o soldado, só que as batalhas são de outra guerra.
Dos “poetas”, desses sim, rezará a História.
São tão ingénuos como os outros, tão mal pagos como os outros, tão assíduos como os outros, mas tão loucos como os outros não são. É essa a sua principal virtude. Vingam-se da própria condição e do próprio estatuto, transformando o acto de ensinar num sabor de gelado no Verão ou de chocolate quente no Inverno. Apaixonam-se logo pelas coisas, emocionam-se com as pessoas, reivindicam dos poderes divinos, para, logo a seguir, esquecerem as guerras, porque se tornam incómodas.
A aula é um gosto por si só, com matéria estabelecida ou sem ela, e ser professor é uma interacção de linguagens. Vibram com o entusiasmo e provocam-no. São líderes nas viagens que proporcionam através do imaginário…
Saltam janelas e grades, mergulham na vida e a aula ilumina-se e transfigura-se. Não há pausas nem compassos, porque todos os minutos têm o mesmo sentido de cumplicidade e de risco, o mesmo prazer de estar: em ironia, em tristeza, em transparência, em descoberta, em alegria, em aventura. E durante todos os momentos se processa o ensino/aprendizagem, na sua maior dimensão. Estes são os verdadeiros professores, aqueles que os alunos não esquecem e que conquistam quase sempre um lugar nas páginas dos seus diários. Extravasam a escola e permanecem na memória, porque têm a coragem de incentivar o acto de viver.”

In Balancho, Maria José,”Motivar os alunos”

4 comentários:

Helder Barros disse...

Excelente texto. São estas palavras que nos animam, que nos elevam, que nos fazem querer ser professor. Ir ao encontro do sonho, da quiméra, das aulas de magia partilhada!

Anabela Magalhães disse...

Excelente texto, também achei.
É por isto que eu sou professora. Quanto às grelhas e grelhados, farei todos o melhor que posso e sei, porque não consigo fazer de outra forma, mas, cá para nós que ninguém nos ouve,...
Que se lixem!

Anónimo disse...

obrigado pelo sorriso que este texto me arrancou! ainda por cima hoje. Ainda por cima agora. Daqui(<3) o meu obrigado...

Anabela Magalhães disse...

Fico contente por te ter feito sorrir, Nuno.
Neste início de ano lectivo precisamos de sorrir mais do que nunca. E de sonhar. Não te esqueças de sonhar.
Fica bem.
Beijinhos

 
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